O estudo a ser apresentado focaliza a incorporação na escrita de fenômenos de mudança na língua falada que, no entanto, encontra restrições para entrar na escrita. Na pesquisa, eu me concentro na emergência e no espraiamento da construção muitas das vezes em alternância com muitas vezes, que encontra semelhança com o fenômeno do dequeísmo. Partindo do pressuposto de que o acréscimo da preposição é resultado de um processo de cruzamento sintático, procuro demonstrar que a forma muitas das vezes, percebida e avaliada negativamente pelos usuários do português, constitui uma inovação pouco propícia a ser incorporada na escrita por razões que já encontrei em outras investigações acerca de outras variáveis. Comprovo que a variante inovadora só tem início no português a partir do século XX e é empregada no Português do Brasil (PB) e no Português Europeu (PB). Utilizo várias amostras para atestar, através de uma ampla análise de dados da fala e da escrita, que a baixa produtividade da construção em foco na fala e sua quase total ausência na escrita se deve ao princípio de marcação que exerce pressão de retração ao avanço da variante inovadora, seja em decorrência da função sócio-simbólica estigmatizante da construção, seja em devido ao fato de que a variante muitas vezes ser mais fácil de processar, mais econômica e menos marcada. Assim, a taxa baixa de emprego de muitas das vezes pode ser explicadada, de um lado, pela aquisição de uma nuança de significado em muitas das vezes que se investe de uma função partitiva ausente em muitas vezes, de outro, por constituir uma forma marcada que compete com uma outra de uso mais amplo e irrestrito, o que dificulta sua entrada efetiva para a modalide escrita no Português. A pesquisa ainda pode lançar luzes para a emergência de outras estruturas inovadoras como algumas das vezes, tanta das vezes e, quem sabe, construções assemelhadas do Espanhol.